No Boletim de Graças, o Dr. Dias de Azevedo, antes de contar o seu
primeiro encontro com a Beata Alexandrina, informa:
Exerci clínica uns dezassete anos sem conhecer a Alexandrina, mas,
em Fradelos, ao aconselhar esta ou aquela pessoa muito doente a que
tivesse paciência nos seus sofrimentos, ouvi uma ou outra vez dizer:
‘Sim, Sr. Dr., se tivesse a paciência da Alexandrina…’
Primeira visita à Beata Alexandrina
E continua logo:
Que Alexandrina é essa de quem se fala, perguntei uma vez. “Da
Alexandrina de Balasar”, ouvi eu em resposta. No entanto, depressa
esqueci a impressão das palavras que ouvira, embora, já um pouco
distante fosse conhecida a paciência da nossa heroína.
Em 1940, adoeceu gravemente uma senhora da Trofa, terminando a sua
doença com uma glomérola-nefrite e amaurose. Era eu o seu médico
assistente, mas sob a direcção de bons médicos do Porto, declarando
eles por fim que era incurável a sua doença e próximo o seu fim.
O marido, um daqueles homens que é capaz de ir ao fim do mundo para
conseguir uma coisa útil que tenha em vista, foi pedir ao Servo de
Deus Pe. Cruz, S.J., o favor de vir ver a doente. Ele veio e teve
palavras de muito conforto, prometendo rogar por ela. Mas a doente
ia piorando, e de que se lembra o marido? Tendo ouvido dizer que em
Balasar havia uma doente muito boa pessoa e de quem se falava com
admiração, resolveu pedir-lhe que intercedesse pela cura da sua
mulher. Convidou-me a acompanhá-lo e lá fomos nós os dois e outros,
em 29/1/41.
Tendo sido recebidos no seu quartinho, lá estivemos a conversar
talvez umas duas horas. A conversa era entre uns dois ou três e a
Alexandrina, e eu conservei-me silencioso, a observar tudo o que se
passava. Pareceu-me que a minha presença impressionava um pouco a
Alexandrina e eu achava graça ao seu olhar simples e cândido, mas
profundo, que parecia ver tudo o que somos.
No fim da conversa, fiz-lhe umas perguntas a respeito da sua
paraplegia e, nessa ocasião, ela ficou sabendo que eu era médico.
Prometeu-nos que ia rogar muito pela nossa doente, mas foi-nos
dizendo que era preciso conformarmo-nos sempre e em tudo com a
vontade de Deus.
Ao sairmos da sua casa, resolvi ir falar com o pároco, o Sr. Pe.
Leopoldino Mateus, porque me parecia ser extraordinária uma criatura
que falava como ela falou, atentas as condições em que tinha vivido.
Na conversa com o Sr. Pe. Leopoldino, este fez as melhores
referências à Alexandrina, dizendo-me que era a melhor auxiliar da
sua vida pastoral e que visse se o director espiritual dela – o Sr.
Pe. Mariano Pinho, S.J. – me autorizava a assistir às sextas-feiras,
das doze às quinze horas, a uns fenómenos que se passavam com essa
sua paroquiana.
Pouco depois, fomos a Braga e obtivemos a desejada licença, trazendo
um cartão a recomendar à Alexandrina a referida doente da Trofa.
Rendido!
A
data de 14 de Fevereiro de 1941 constituiu um marco na vida do Dr.
Dias de Azevedo. Não se tratou duma conversão, mas duma descoberta.
Foi nesse dia que ele assistiu pela primeira vez a um êxtase da
Beata Alexandrina. Recordando os fenómenos que observou, classificou-os
de “impressionantes, maravilhosos, inolvidáveis”.
Ficou cativado, assombrado e rendido. Muito ia ter de lutar desde
então, mas, como afirmaria, estava ali a “glória” da sua vida. Tinha
na altura 47 anos.
Regressemos ao relato autobiográfico:
Fomos assistir aos tais fenómenos no dia 14/2/41. Eram
impressionantes, maravilhosos, inolvidáveis, e não se poderá duvidar
mais tarde do que agora afirmo, porque eles estão filmados para a
posteridade ou para a ocasião que seja oportuna.
Mais do que a primeira visita, foram os êxtases que deixaram o
médico tão vivamente impressionado.
Mas ainda há que ouvir algo mais:
No dia seguinte, a 15/2/41, escrevi ao Sr. Pe. Mariano Pinho o
seguinte:
Irei mais vezes a Balasar e procurarei como médico estudar a doença
da Alexandrina, doença que acompanha os dotes de que o Senhor a
dotou. Essa doença, que deverá ser uma mielite lombar e que deverá
ser registada por vários médicos, a meu ver, mais realça todos os
fenómenos que se passam todas as sextas-feiras, principalmente no
que diz respeito a movimentos.
Uma
alma a transbordar de Sobrenatural
O Dr. Dias de Azevedo registou ainda estes traços para um muito
elogioso retrato da Beata Alexandrina:
Enquanto a fisionomias várias, compostura de movimentos, profundeza
de conceitos teológicos e místicos expressos, tudo isso é
simplesmente admirável. Nada, absolutamente nada do que se passa,
quer sob o ponto de vista clínico quer sob o ponto de vista
teológico, nos poderá permitir classificar de naturais os fenómenos
que observamos. Depois, a sua vida humilde e despretensiosa, a sua
falta de cultura, o seu equilíbrio de inteligência e maneiras, a sua
resignação completa, humilde profunda, os seus rasgos de génio
amiudados, tudo isto envolto numa simplicidade encantadora, dá
provas manifestas de que se trata duma alma a transbordar de
Sobrenatural.

O Dr. Augusto de Azevedo e a Alexandrina
Sobre a doença dela, não foi peremptório, mas apontou para a mielite
lombar, ressalvando que deveria “ser registada por vários médicos”.
O arauto
Escreveu o Pe. Humberto Pasquale que, em Dezembro de 1944, Jesus
disse à Beata Alexandrina: “Faço do teu médico o arauto da minha
causa”. Embora não tenhamos encontrado esta declaração nos
Sentimentos da Alma, consideramos que ela faz todo o sentido e
constitui uma nobilíssima tarefa atribuída a este sábio católico.
Como se verá à frente, Jesus há-de chamar-lhe “procurador da minha
divina causa”, “defensor da minha divina causa”.
Ele assumiu a função de arauto como coisa muito sua, sem regatear
esforços, numa luta renhida, frequentemente espinhosa.
José Ferreira |